quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

Notícias

"You made me forget myself" - Lou Reed

Tanto tempo longe deste blog. Longe de minhas reflexões. Isso era tão importante para mim. Tenho agora a impressão que eu era tão preso as minhas idéias e a um mundo que eu não vivia. Simplesmente refletia. Minhas dores, meus pensamentos, minhas frustrações e devaneios. Agora simplesmente vivo. Algo que sempre almejei, nos meus sonhos. Não quero mais saber o que me faz assim. O que me trouxe até aqui. Só vivo, respiro, deixo as minhas idéias flutuarem por ai. Não me preocupo com o que quero, somente quero. Somente deixo querer. "Let it be" finalmente funcionou. A vida corre solta agora. Está difícil refletir sobre tudo o que aconteceu. E isto é bom, é ótimo. Feliz simplesmente por estar. Eu sabia que não precisava muito, que eu sempre soube tirar o máximo proveito de tudo, mas que a vida estava sendo dura demais comigo. Eu só precisava uma chance, apenas uma. E isso aconteceu. Ela me ofereceu uma chance e eu apenas aceitei. Bastava isso para eu ser apenas eu mesmo. Sinto-me até estranho por apenas encontrar algo de mim que sempre soube que existia. Uma espontaneidade. Uma existência mais real. E no meio disso tudo surge algo lindo e puro, que eu nem pensava encontrar. Algo que me fez se sentir vivo novamente. Um sopro de vigor e de esperança. Balançou minha alma e a fez se deslocar levemente. Apenas deixei meus pesadelos e voltei a sonhar. À somente viver por viver.

domingo, 25 de outubro de 2009

Nowhere Man

Não tenho mais um lugar. Minha relação com o tempo mudou. Minha alma está perdida, e pela primeira vez isso não significa algo ruim. Tudo agora é transição. Não tenho mais meus referenciais. A liberdade surge um pouco assustadora, mas aos poucos ela vai ganhado contornos mais claros. Onde está o Eu nisso tudo? Em lugar algum. Sou o nowhere man.

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

I'm Going to Darklands

Darklands


Terras Escuras


The Jesus and Mary Chains
Album "Darklands", de 1987




i'm going to the darklands
Estou indo para as terras escuras

to talk in rhyme
Para conversar em rimas

with my chaotic soul
Com minha alma caótica

as sure as life means nothing
Certo como a vida nada significa

and all things end in nothing
E todas as coisas acabam em nada

and heaven i think
E o Céu, eu acho...

is too close to hell
Fica próximo demais do inferno


i want to move i want to go
Quero me mover, quero ir,

i want to go
Quero ir


oh something won't let me
Oh, algo não quer me deixar

go to the place
Ir até o lugar

where the darklands are
Onde ficam as terras escuras


and i awake from dreams
E acordo dos sonhos

to a scary world of screams
Para um mundo tenebroso de gritos

and heaven i think
E o Céu, eu acho...

is too close to hell
Fica próximo demais do inferno


i want to move i want to go
Quero me mover, quero ir,

i want to go
Quero ir


take me to the dark
Me leva para o escuro

oh god I get down on my knees
Oh Deus, me coloco de joelhos

and i feel like i could die
E sinto que poderia morrer

by the river of disease
À margem do rio da doença

and i feel that i'm dying
E sinto que estou morrendo

and i'm dying
E estou morrendo

i'm down on my knees
Estou de joelhos

oh i'm down
Estou caído


i want to go i want to stay
Quero ir, quero ficar,

i want to stay
Eu quero ficar...



quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Sonho

Eu estava em uma casa estranha, mas acho que era a minha, pois haviam coisas que aparentemente remetiam a minha pessoa. Só lembro de um aparelho de som, o que por si só já diz muito sobre mim.

Eu estava com alguém que representa o novo, algo que difere muito do que sempre busquei. Havia um misto de ansiedade, medo e desejo - o que caracteriza o clima de um ótimo encontro. Eu sentia-me desprotegido, mas ao mesmo tempo vislumbrava a possibilidade de inverter o jogo. Em um olhar demonstrou que era ela quem desejava ser acolhida, que naquele momento eu deveria deixar surgir quem eu realmente sou e que toda aquela fragilidade poderia agora ficar de lado, pois era a minha força que ela buscava - uma força que talvez havia se ausentado por um tempo mas que permanecera latente.

Ela sabia disso e confiou em mim. Se entregou com a beleza que somente uma mulher consciente de seu desejo possui. E eu respondi prontamente. Toda a ânsia do primeiro encontro entre os corpos se dissipou nessa hora.

O som estava ligado no aleatório. E de repente uma música do Josh Ritter começa: "I thought I heard somebody calling in dark, I thought I heard somebody call". Um clima de tensão toma conta do ambiente. "Por que agora esta música?" - pensei. Tudo se desfez na hora, a garota sumiu e o vazio voltou. Então eu acordei.

A música que um dia representou um momento de alegria retorna agora assustadora. Ela já fora trilha sonora de um episódio em que tudo parecia perdido mas uma voz surgiu e retirou-me do escuro. Agora a música tocou para lembrar-me que a mesma voz não apareceu para me salvar quando precisei e eu não poderia mais contar com ela.

Eu fiquei com a música o dia todo em minha cabeça. Eu estava com raiva. Um sonho em que tudo estava indo tão bem fora interrompido por uma música que há muito tempo eu não ouvia e que me trouxe diversas lembranças do passado. O que significava esse sonho? Que talvez apesar de tudo o que se passou, e da ânsia atual pelo novo, eu ainda queria ouvir aquela voz chamar-me novamente.

Trilha Sonora: Josh Ritter "The Dogs or Whoever".


terça-feira, 8 de setembro de 2009

Mixtape Contos Neuróticos Cotidianos

Resolvi juntar as músicas que foram trilha sonora aqui no blog e deixá-las para download, assim como comentários faixa-a-faixa, no outro blog, que há bastante tempo está parado. Segue o link para ler e baixar:

Alcoholiday

Um feriado. Litros e mais litros de álcool. O desejo de diversão a qualquer custo. Dias vivendo nessa ilusão etílica. Um corte. Abstinência. Angústia volta à toda. E ai percebe-se que mais um pedaço de si se foi.

A volta à realidade é dura, machuca. Sentimento de uma alma despedaçada, partes que tentaram juntar-se mas que apenas fragilmente encontravam-se. E alguns dias de perdição bastaram para tudo desfragmentar-se novamente.

O álcool traz a ilusão de que um ser único e inteiro é possível. Sob o seu efeito, um super-homem surge confiante e arrogante. Ri de tudo. É o bobo da corte e o rei ao mesmo tempo. Sente que pode tudo. Alguns dias depois o rei cai e só sobra o bobo da corte. Um palhaço rindo de si mesmo, pois sua graça acabou há algum tempo.

O que sobra é um humano. O real volta com toda sua força: jogando-o contra a parede. Mostrando claramente que você é o que é, e que aquele ser supremo que você busca é um falso personagem de uma pseudo-história que você inventou para tentar deixar sua realidade bem mais amena. E que no fundo você é ainda aquele ser despedaçado que busca se reintegrar, mas agora sem a falsa ajuda do santo elixir que promete juntar tudo, para logo depois te jogar contra o chão e deixá-lo pior do que você já estava.

Foi apenas mais um "Alcoholiday". E mais uma volta assustadora ao real.

Trilha Sonora: Teenage Fanclub "Alcoholiday", do disco Bandwagonesque (1991).

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Que Pena

É impressionante como a lembrança de fatos e coisas tão doces podem um dia se apresentarem tão amargas. A memória está sempre sendo reescrita. Alguns afetos são diretamente vinculados à lembrança, porém algumas acabam surtindo outros sentimentos com o passar do tempo.

Aqueles momentos felizes e deliciosos que vivemos em um passado próximo, e que eram guardados com zelo e carinho, agora afligem. Incomodam por que havia a ilusão de que eles seriam para sempre rememorados e reatualizados quando vivenciaríamos coisas novas. É aquele fim de tarde gostoso com a pessoa amada, tomando uma cerveja gelada, e de repente um dos dois fala: "se lembra aquela tarde que passamos na praia? Foi tão bom!". E essa frase simples surge justamente para apontar que continuamos desfrutando momentos maravilhosos assim como aquele que passamos há um bom tempo atrás. Esse fio de continuidade que apenas pessoas que conviveram muito tempo juntas podem desfrutar. E é justamente o rompimento deste fio que faz com que momentos lindos de um passado recente sejam relembrados agora com um pesar, uma sensação de que com aquela pessoa você nunca mais irá vivenciar isso. É a amarga melancolia.

O que resta é esperar que aquelas lembranças boas voltem a serem o que são, que causem aquela nostalgia boa, e não que surjam como sustos no meio daquela madrugada solitária. É tentar seguir Jorge Ben, conjugando alegria com a desilusão.

Que Pena
Jorge Ben

Ela já não gosta mais de mim
Mas eu gosto dela mesmo assim
Que pena, que pena
Ela já não é mais a minha pequena
Que pena, que pena

Pois não é fácil recuperar
Um grande amor perdido
Pois ela era uma rosa
As outras eram manjericão
Ela era uma rosa
Que mandava no meu coração
Coração, coração

Mas eu não vou chorar
Eu vou é cantar
Pois a vida continua
E eu não vou ficar sozinho
No meio da rua
Esperando que alguém me dê a mão

Trilha Sonora: Jorge Ben "Que Pena", do disco Jorge Ben (1969);

domingo, 16 de agosto de 2009

O Jogo (ou a volta da Vida Pôquer)

Uma tarde vazia. Um início de noite vagaroso. Perspectiva de uma semana qualquer. Pouco a acontecer, a não ser que algo mude repentinamente. São coisas da vida.

Não sei o que esperar. Nunca o incerto foi tão presente. É bom. É ruim. A liberdade é também sufocante, em alguns momentos. É como uma mulher insuportavelmente linda e arrogante. É perigosa, misteriosa. Esconde o jogo o tempo todo. Disfarça, dissimula. Nunca se sabe realmente a sua intenção, a não ser que você se jogue e pague para ver. É o famoso preço da liberdade (vide o post Cronica da Vida Pôquer).

Jogar, é o que resta. São poucas fichas, mas há a possibilidade de ganhar várias outras. Ou não, perder, e se recompor novamente.

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

We Carry On

Garganta seca. Angústia ou sede? Passou a noite naquele boteco cheio de putas. O olhar fixo para fora do bar. Caia uma chuva pesada. Dentro, aquele cheiro característico de zona o enojava. Já era seis da manhã. Era agora. Tomou um trago e acendeu o último cigarro. Saiu calmamente do bar e entrou no Passeio Público. A chuva havia parado. O único som que distorcia o silêncio era os pássaros agitados.

Ele tinha certeza de que ela estaria em casa. Era ali o seu ganha-pão. Seu único receio era encontrar mais alguém por lá a essa hora. Ele precisava libertar sua alma, mesmo que isso custasse aprisionar seu corpo - paradoxo cartesiano. Estava decidido. Não há certeza maior do que virar uma noite bebendo a procura de uma resposta e às 6 da manhã ela ainda parecer a mais correta. Subiu as escadas húmidas. A porta sempre estava apenas encostada. Garrafas, seringas, e caixas de papelão pelo chão.

O revolver carregado. Uma bala. Era o que precisava. Duas o matariam também. Entrou no quarto escuro. Parecia haver ninguém. Ao lado da janela escancarada percebeu a silhueta de uma mulher. Era Janaína, ele tinha certeza. Engatilhou a arma, apontou. Sua mão tremia sem parar. Lágrimas escorriam de seu rosto. Não conseguia fixar a mira. Foi se aproximando. Ela parecia dormir. "Acorda, levanta daí!" - gritou. Nenhuma resposta. Um chute em suas costas. Nada. Arrancou o cobertor, Jana estava nua, branquíssima. Os olhos estourados. Seringa cheia de sangue pendurada no braço. Era tarde demais.

Um tiro no escuro.

Trilha Sonora: Portishead: "Hunter", "We Carry On", "Roads"; Pedro the Lion: "Bands with Managers".

terça-feira, 28 de julho de 2009

04:56 a.m.

Para Um Amor

Sonhei que enquanto eu dormia, você chegou de mansinho. Seu corpo procurou o meu do mesmo modo que costumava buscá-lo nas madrugadas frias. Abraçou-me forte e acaraciou minha nuca. Suspirou e me disse: "calma, agora tudo está bem".

Meu amor por ti talvez até aumentou. Notei isto ao constatar a ausência que ficou. Minha alma está castigada, ela tem apanhado demais. Quando sossega é porque parou de vagar, de tentar procurar razões para tudo o que se passou.

Agora é o lento passar do tempo que nessas horas tem sido cruel. Há a espera de respostas de coisas que talvez não venham. Sonhos acordados. Sonhos adormecidos. Não creio que tenhamos nos afastado tanto. Pois ainda sinto rastros de sua alma por aqui. Ainda acordo sentindo o seu cheiro. O gosto de sua pele está em meu paladar.

São nuvens escuras que passam sem parar, onde antes o sol costumava brilhar. São pequenos desencantos, desgostos de uma vida longa e que não é só feita de lances felizes.

É só mais uma madrugada que resolveu se estender. É o medo de acordar e perceber que tudo foi apenas um sonho. E que minha cama está fria a me esperar. Será mais um longo dia tendo a saudades como companhia.

Com a falta, o desejo só aumenta. E ela tem aparecido sempre. Vem acompanhada de doces lembranças de tempos em que ela costumava ser ausente. Era quando os corações se enchiam de uma alegre euforia. E o seu sorriso completava o meu, e era o mais belo de todos.

Ainda acho que com o tempo as almas irão se reencontrar, com aqueles sorrisos que costumavam se ver. Por enquanto só resta tentar adormecer novamente e buscar que os sonhos deixem de ser o que são, para apenas cumprirem suas funções de realizarem-se.

quinta-feira, 23 de julho de 2009

Anesthesia

Há um paradoxo na anestesia. Em um tratamento dentário é a infiltração de uma substância analgésica no local onde se pretende tratar. Ela é utilizada para que o paciente não sinta a dor provocada pelas brocas e outros instrumentos assustadores. Porém a sua aplicação é através de uma injeção diretamente na gengiva, causando uma "picada" horrível. A dor da picada é muito mais psicológica do que físiológica, ao ponto de haver pessoas que preferem fazer o tratamento sem anestesia - o caso de minha mãe, por exemplo.

O paradoxo é justamente esse: uma dor pequena para anular uma dor maior, mesmo assim, alguns preferem encarar a dor maior sem aditivos. Eu lembro de uma música muito curiosa do Metallica - minha banda favorita na adolescência - que era um solo de baixo com distorção e que chamava-se "Anesthesia (Pulling Teeth)". A sonoridade desta música faz referência a um tratamento dentário, e parece representar o que é subjetivamente a anestesia para o autor: algo etéreo, entorpecedor, porém perturbador.

É assim que me sinto em um tratamento dentário. A anestesia dói um pouco na picada, tudo se amortece e você não sente mais os procedimentos. Porém você não vê a hora daquilo acabar, daquele som da broca sumir e sair logo dali. É um processo que mesmo sem dor é assustador. Mas você encararia tudo sem a anestesia?

Mesmo aqueles que preferem sem anestesia, há procedimentos que não é possível sem. Não há pessoa que suporte um estímulo doloroso tão grande. E se há situações em que ainda é possível escolher com ou sem anestesia, surge a dúvida.

segunda-feira, 6 de julho de 2009

quarta-feira, 1 de julho de 2009

Here Comes the Sun (It's been a long and cold winter)

Eis que surge o sol novamente, após um longo período de céu cinzento e umidade. Já não sei mais a última vez que o vi brilhar por aqui - talvez foram apenas alguns dias, talvez uma semana, só sei que minha alma estava embolorando.

Acordei e tomei café com os raios do sol atingindo meu rosto. Eram fracos ainda, mas tão reconfortantes. Surgiu um clima de esperança no ar. Tem sido um longo e frio inverno, mesmo estando apenas no ínicio. Os ossos quase se acostumaram com o ar gélido e dolorido. E por isso foi tão bom encontrá-lo novamente. Coisas boas estão por vir.

O som deste inverno é o já velho e ainda muito bom Yo La Tengo.

"darkness always turn into the dawn"

Trilha Sonora: Yo La Tengo "Pablo and Andrea", "The Ballad of Red Buckets", ambas do álbum Electr-o-pura (1995).

domingo, 21 de junho de 2009

Perdas

Talvez eu esteja a semana toda tentando me preservar. Ou esteja a semana toda tentando chorar. E eis que estou aqui me achando rídiculo novamente. Pensando sobre o absurdo da vida simples. Só queria dizer que sofri algumas perdas esta semana. E dói tanto dizer isto. Algumas são coisas simples, outras tão doloridas. Mas por que estou falando tanto em perdas? Porque talvez perdi demais. Só posso falar de algo que aconteceu agora, pouco tempo.

Perdi mais um cachorro. E isso não é pouco. Era a Magrela. Ela se foi. Sem ao menos qualquer elaboração minha. Se foi assim como chegou: uma cachorra de rua, sem alarmes, sem surpresas, apareceu, conquistou a todos. E foi. Só foi. Novamente fui eu quem encontrou. Dessa vez doeu menos, pois da última vez foi o Kiko. Doeu a dor de minha mãe. Isso doeu demais. O Kiko era o sonho de minha infância indo embora. A Magrela foi mais uma parte de minhã mãe se indo.

Estou tão triste e não é só por isso. Por tudo. Só por tudo.
Dói a minha solidão. Dói eu mesmo. E essa dor só posso eu encarar.

Trilha Sonara: Carissa's Wierd "September Come Take This Heart Away".

terça-feira, 16 de junho de 2009

O Mito da Caverna (ou O Estrangeiro)

O tempo se arrasta. Picos de angústia e incerteza. Diversas dúvidas surgem. Não queria dúvidas. Estava começando a gostar das certezas, estas que sempre me foram tão caras... Talvez existam coisas que não consigo enxergar e tantas outras que estejam ofuscando minha visão.

Sempre olhei muito para frente - e isto é quase sempre um incômodo. As vezes por se adivinhar com alguma antecedência algo que só se deveria saber daqui a algum tempo. As vezes por simplesmente conjecturar por antecedência o que talvez nem irá se concretizar. É algo como o mito da caverna de Platão. Procurar um saber implica responsabilidade. Implica ampliar os horizontes de uma forma quase incontrolável e nisso, a liberdade implode.

Lembro-me de uma metáfora de Camus em "O Estrangeiro". Era algo como: a situação em que o homem encontra-se mais livre é a prisão, pois ali não há escolhas. E ter justamente muitas opções é o que restringe nossa liberdade. Parece haver um erro nessa proposição, não? De certo modo não. Quando temos poucas opções, temos poucas dúvidas. O que gera a angústia é justamente não termos o controle sobre tudo o que nos atinge. E procurar por esse controle é o que nos torna neuróticos, pois nunca nos satisfazemos, justamente por haver muitas opções e o desejo de querer provar todas. Ai sucumbimos à angústia. Quando escolhemos um, abrimos mão de outro. E se esse outro fosse melhor? Será que a minha escolha é realmente a melhor? Típicas questões neuróticas.

Quando escolhemos algo, escolhemos a nós mesmo e todo o universo, como diria Sartre. Eis o paradoxo da liberdade. Ao escolher sair das dúvidas intermináveis e encarar a dura e consistente certeza me deparei com outro problema: perdi muito de mim ao abrir mão das dúvidas. E agora não me reconheço mais nelas. Eu esqueci que por mais que se opte pela certeza, as dúvidas não deixarão de existir. Apenas se optou por uma parte da realidade. E agora como ser eu sem eu?

O medo do novo. O medo de conseguir deixar de ser o mesmo velho. "Nada do que não era antes quando não somos mutantes". A angústia não é pelo novo, no por vir. É pela perda do velho, daquilo que se constituiu enquanto certo, e que caso venha a se confirmar, não passou das velhas incertezas e dúvidas, que num passo de ilusão, se camuflaram em certezas. Fracas, inconsistentes, e potencialmente inebriadoras, ilusórias, e principalmente, necessárias.

Trilha Sonora: iLiKETRAiNS "The Voice of Reason" e "Death of an Idealist", ambas do álbum Elegies to Lessons Learnt (2007); Radiohead "The Pyramid Song", "Lucky" e "You and Whose Army", todas Ao vivo em São Paulo; Pedro the Lion "Bands of Managers" do álbum Achilles Heel (2004), "Of Up and Coming Monarchs", "The Longer I Lay Here", do álbum It's Hard to Find a Friend (2001).

domingo, 14 de junho de 2009

A Estrada

Cause I'm writing to reach you now but
I might never reach you
Only want to teach you about you
But that's not you
Do you know it's true
But that won't do

Maybe then tomorrow will be Monday
And whatever's in my eye should go away
But still the radio keeps playing all the usual


Writing to Reach You, Travis


Pegar a estrada novamente? Putz! - pensou Pedro naquele domingo frio. Ele havia feito de tudo para que desta vez conseguisse manter-se pelo menos um ano em um lugar só. Mas parece que tudo havia ruido novamente. E dessa vez não era sua culpa. As coisas para Pedro funcionam da seguinte maneira: por mais que ele tente, se esforce para encaixar-se nos lugares, os lugares não se encaixam a ele.

Naquela manhã Pedro acordou encomodado. Dessa vez a partida seria mais dolorida que de costume. Ele havia se acostumado demais ao modo atual de viver. Está certo que se por um lado tudo era mais parado e corriqueiro - em oposição à vida fugaz e louca que levara antes -, agora ele sentia que havia vivido algo realmente verdadeiro, profundo e marcante, e por isso talvez a angústia.

Perdas. Será uma perda grande. Mas se já foram tantas, o que difere agora? Ele sentia que esta o marcaria para sempre. Era metade dele que ele abanonara naquela manhã. E pensar nisso o fez rememorar todas as outras. O que difere uma grande perda de uma pequena é que aquela traz a tona todas as outras. Todas que fazemos questão de esquecer em cada manhã que acordamos. E justamente nesta manhã Pedro acordou e sentiu o baque. E toda uma sequência de coisas que perdeu surgiram em sua consciência.

Why does it always rain on me?

A música do Travis não saia de sua cabeça. Por que sempre acontece isso comigo? Está certo que tudo isso me fortalece, mas a que custo? O custo de perder-se o tempo todo, de buscar caminhos, de distorcê-los, de encontrar novamente uma saída. Por que diabos só chove em mim!!?

Não havia mais o que se lamentar. A hora chegou. Era preciso levantar-se, juntar o que restou de si mesmo e ir em direção à estrada vazia. Caia uma neblina que gelava mais ainda o carro que custava a pegar. Era preciso que fosse assim. No frio mesmo. Ás 5 e 13 da matina. Não havia do que se arrepender, pois desta vez não dependia dele. Era preciso encarar de cabeça erguida. Pedro já não sabia mais, de todos os pedaços perdidos, qual iria sentir mais falta. Talvez aquele que nos ultimos meses representou quase a totalidade dele, e que ele não sabia mais diferenciar se era uma parte ou ele próprio. Este sim iria doer. E era ele que o fez ter que fugir, encarar uma estrada que há muito não pegava.

A velha conhecida e solitária estrada.

Trilha Sonora: Travis, álbum "The Man Who".



sábado, 23 de maio de 2009

Lucia

Passamos a tarde inteira em seu apartamento. Céu cinzento, garoa fina lá fora. Quando cheguei Lucia estava só de calcinha, com uma camiseta velha do Sonic Youth. Conhecemo-nos em um boteco que sempre frequento. Estava lá ela sentada, fumando um cigarro atrás do outro, sem perceber as pessoas a sua volta. É difícil definir a relação que tenho com ela. Às vezes nos encontramos e passamos longas horas juntos, conversando sobre qualquer coisa. Outras vezes só transamos. Já tentamos engatar um namoro, mas logo acabou. Não conseguimos superar as diferenças mais básicas. Uma relação aberta que acabou se fechando.

Entrei e me joguei no pufe marrom que fica próximo a uma grande janela. Esta sala tem uma vista maravilhosa do centro de Curitiba. Lucia colocou o cd do Joy Division e eu já sabia: vamos fumar um. Geralmente era a mesma coisa: Joy Division – fumar um – transar – morrer no sofá – transar de novo – sair para comer algo. Mas Lucia conseguia fazer tudo parecer diferente e novo cada vez. Ela tem a pele bem clara, olhos verdes. Um jeito soturno, é o tempo todo séria e as poucas vezes que sorri é magnífico. O que me atraiu nela, de cara, foi uma aparente frieza. Sempre irônica e cáustica com tudo e todos. Ela aparentava ser muito fechada, falava pouco. Eu gostava da forma como se guardava – escondia o jogo.

Sexualmente ela explodia. Aquela menina séria e calada tornava-se uma puta. Lucia gozava de um jeito muito louco. Ela começa a se contorcer e a emitir grunhidos estranhos que vão crescendo até o fim. Parece um animal em fúria. De inicio estranhei, depois comecei a apreciar a forma naturalesca de seu gozo. 

Ficamos mais um tempo estendidos por ali e resolvemos sair. Eu adoro rodar pela cidade de carro. Era umas nove da noite, o centro já estava mais quieto. Eu estava louco para tomar uma cerveja, mas não estava afim de ver pessoas. Compramos umas garrafas e decidimos ir ao parque beber.  Sentamos em frente ao lago. Caia uma fina neblina nessa hora.

- Por que não demos certo? - Perguntou Lucia. - Nos entendemos tão bem, o sexo é bom.

- Estávamos muito loucos naquela época. Tudo era tão confuso. Você acabara de perder sua mãe. Eu bebendo pra caralho.

- Mas e agora? Por que não ficamos juntos?

- Porque agora nos conhecemos. 

Era estranho isso. Mas era real. Enquanto Lucia era um enigma para mim tudo ia bem. Quando comecei adentrar em seu mundo, tudo ruiu. A questão não era sua vida conturbada na época. Era a combinação. Lucia em paz já era um inferno. Sem beber já não sou das melhores pessoas para se conviver. Um tentava segurar as pontas do outro. O que para nós significou: "um controlar a vida do outro". E a liberdade de cada um implodiu.

Senti um tom de tristeza em sua fala naquele dia. Quando voltamos a nos falar decidimos que não iríamos mais tocar no assunto da separação. Mas era inevitável. As lembranças estavam frescas ainda. As brigas, os jogos sexuais que só buscavam auto depreciação. As humilhações. As perdas. Na verdade não sei como conseguimos voltar a se encontrar. Era como um acordo tácito: não podemos ter tudo um do outro, mas não conseguimos ficar sem ao menos uma parte. Era triste, mas era o que restou. Lucia voltou a ser um enigma. E eu a cair fora quando torno-me insuportável.

Trilha Sonora: The Veils: "Lavinia", "The Leavers Dance", "Talk Down the Girl", "The Valley of New Orleans", "Vicious Traditions", "The Nowhere Man" (todas do álbum "Runaway Found" (2004); The Verve: "Valium Skyes", "Numbness" (ambas do álbum "Fourth" (2008).

quinta-feira, 9 de abril de 2009

Pós-modernizices

Escrever tem sido uma tortura - uma necessidade e uma tortura. Os tempos atuais são de um predomínio cada vez maior da compactação ou contracção (na falta de uma palavra melhor). Ser mais objetivo o possível. Poucas palavras, de preferência, em linguagem "compacta", provinda da internet. Não se trata de apenas uma consequência da rapidez  com que as informações circulam hoje, como todos pseudo-teóricos e semi-profetas da "era digital" costumam descrever a era atual. É falta do que pensar mesmo. E para escrever é necessário pensar, criar, tirar de algum lugar significantes que consigam se aproximar do sentido buscado. E isso exige esforço, e atualmente, para mim, um esforço brutal.

Sair da inércia estrutural que engloba a tudo e a todos. Tudo está pronto, ali, perto de você. Não há mais diferenciação entre criadores e criaturas - há de salientar que aparentemente só há criaturas, os criadores são virtuais ou ausentes. Como já disse o mestre Chico Science: "computadores fazem arte. Artistas fazem dinheiro". 

Toda essa embromação pós-moderna para dizer que não consigo escrever. Não consigo pensar. Tenho dificuldades em apreciar um filme como obra de arte - aqueles poucos que encantam pelas imagens e fotografia e fazem pensar pelo enredo meticulosamente pensado e estruturado. Ouço ainda muita música. Parei de buscar tantas bandas novas. Sinto que preciso de um espiríto de síntese, o que não significa cortar mais ainda o que se produz hoje, pelo contrário, seleccionar melhor o que ouço, leio, assisto. Pois se produz muito hoje, e justamente por isso estamos cada vez mais perdidos, sem referenciais, o que nos leva cada vez mais a consumir muito (leia-se baixar muitos discos, filmes, etc) e não entender nada.

Já escrevi demais para um post sobre a dificuldade em escrever. Falar sobre pós-modernizices é fácil, pois a própria pós-modernidade é um conjunto de definições absurdas sobre a dificuldade em se definir. 

Trilha Sonora: Nada Surf "The Weight is a Gift" album; Yann Tiersen & Shannon Wright.

sábado, 7 de março de 2009

Resistência

Por que é tão duro sair de si mesmo? Quando tudo parece caminhar bem, algo surge de dentro e te trava. Não há razões, não há escolha. Somente uma perda. O vazio toma conta de tudo. Tenta-se a todo custo correr. Uma fuga alucinada que de nada adianta. Não há tristeza, somente a velha angústia de sempre.
Tentar ser o que não se é. Ser normal quando tudo leva ao caminho oposto. Uma constante busca, e nunca a tão desejada paz. Por que tudo tem que ser tão tumultuado? Por que a tormenta? Por que não me contento em nadar em águas calmas e quentes? Será que tudo é tão entediante quanto imagino que seja?
Perguntas vazias, pois sei que a resposta não está ao alcance. Está em algum lugar dentro de mim, e ir atrás torna-se outra busca. Por que então buscar?

Trilha Sonora: Damien Rice, álbum "9".

terça-feira, 20 de janeiro de 2009

Retorno

Tentar um reencontro. Uma volta à algo tão próximo e que por um tempo se perdeu. Um retorno ao Eu. O fluxo de consciência não funciona mais. Um esforço para que as palavras simplesmente surjam. Cada movimento é contido, pensado, se busca uma pretensa fluidez no discurso. Soa falso. A tensão aumenta ao tentar forçar o sentido. Por muito tempo eu quis fugir disso. Cada vez fica mais dificil se aproximar do afeto. A alienação é facilmente buscada e tomada por ela, tudo parece simples. Após ter se entregado ao nada e ser tomado por um sentido de perdição, fico tentando retornar. Uma volta a si mesmo, ao o que eu imagino ser esse Eu-mesmo. E isto é tão dificil. Tão facil somente deixar-se ao nada. A imagem da ilha não sai da minha cabeça, e até agora tento achar sentido e palavras para compreender o que se passou. É a realidade, é a ela que procuro, justamente de onde eu quis fugir e que agora não posso mais.

Trilha Sonora: Yann Tiersen & Shannon Wright, "Dried Sea"; Yann Tiersen, "Rue des Cascades/Le Parade".