quarta-feira, 31 de maio de 2006

leãozinho

depois de mais um porre, litros de pinga de plástico, saiu cambaleando pela rua imunda. xingou todos, cuspiu em uma velha. detestava o mundo, se detestava. uma semana sem tomar banho. três dias sem dormir. infância pobre, adolescência em reformatórios, vida adulta entre hospícios e a rua. a rua. sempre seu lar, sempre sua desgraça e sua redenção. aprisionado dentro de si, por que ter algo que o prenda? cair no trecho, violão nas costas, cantar para as estrelas. vomitar palavras soltas e desconexas para o desconhecido, ou para algum mendigo que tente lhe ouvir. dormia onde podia cair. um dia, dois litros de pinga. BR-116 sentido São Paulo. dormiu. caiu, braços abertos como se pedisse perdão. um carro em alta velocidade e um braço esmagado. dor. lágrimas. sentimento de punição. deus quis e assim será. conseguiu sobreviver com uma carona de um camioneiro evangélico que, presenciando a cena, achou ser uma dádiva do poderoso poder salvar aquela pobre alma. anos depois, maneta, se ressente unicamente por não poder mais tocar seu violão. se culpa até o ultimo por aquele episódio em que perdeu o braço que lhe oferecia a única contentação à sua alma: os acordes de seu violão. um dia, outro porre, esmaga o fundo de uma garrafa de leãozinho com uma pisada, sua companheira daquela noite. e ao ver aquela garrafa, resolve cortar o fundo e amarrá-la em seu cotoco. uma prótese. pega seu violão e totalmente embriagado, tira um dó maior após anos de silêncio. o que quase lhe acabou com sua vida o trouxe de volta. o leão escreve certo em linhas totalmente tortas.

Trilha Sonora: The Stooges "We Will Fall".