terça-feira, 31 de maio de 2011

Alienação

A felicidade só existe na alienação?

As vezes acho que sim. De certa forma estamos o tempo todo nos alienando. Nos alienamos da dura realidade que nos cerca – e nesse sentido é uma mera proteção. Não podemos simplesmente acordar todos os dias e ter consciência de todas as mazelas e dificuldades que nos cercam. Se não “fecharmos” os olhos, um pouco que seja, para tudo o que acontece – e agora, toda informação do mundo “faz questão” de chegar até nós – não haveria como termos o mínimo de tranqüilidade.

Nos alienamos do rumo que a política toma. Não há como levá-la a sério o tempo todo, como fazem aqueles velhos ranzinzas que passam a tarde lendo jornais. É enlouquecedor!

Ver novelas televisivas é alienador? É. Vivemos por uma hora e meia uma vida que não é nossa. Mas nesse sentido a literatura cumpriria uma mesma função. Há algum problema em sonhar com a vida do outro? Não, desde que tenhamos a nossa própria e saibamos discenir o que é fantasia de realidade.

Aí entro no ponto fundamental. Nos alienamos de nós mesmos. Freud, e principalmente Lacan, sublinharam esta face tão poderosa da psiquê. Estamos o tempo todo fantasiando. E não apenas naquele sentido de buscar a realização de desejos. Achamos que somos determinada pessoa. Acreditamos nesta “persona” e nos apresentamos como tal. Na fantasia somos muitas vezes onipotentes, egoístas e fazemos de tudo para disfarçar esta faceta. Outras vezes somos fracos, carentes, impotentes e chorosos. Seríamos isso mesmo?
Por mais que nos esforcemos para lutar contra o que pensamos de nós mesmos, é assim que agimos. Em uma dúvida constante: será esta “face” o “Eu” verdadeiro? Sou tão ruim quanto acho que sou? Tão bonito como gostaria?

Estamos o tempo todo querendo ser alguma coisa, alcançar alguma meta, ter tal e tal coisa. Nunca satisfeitos e quase sempre alienados do que realmente queremos, temos e somos. Preferimos viver uma ilusão momentânea, onde em frações de segundo “sou” algo para alguém, tenho algo que o outro queira ou reconheçam-me enquanto tal. São os lampejos de felicidade.

Freud apontou para o fato da felicidade ser somente episódica. Não há “A Felicidade”, um estado absoluto que pode ser alcançado, como os livros de auto-ajuda cansam de pregar. Há momentos de euforia. Mas seria só isso?

Acho que há uma felicidade que pode ser construída, passo-a-passo, dia-após-dia. Ela é menos intensa como as buscas momentâneas e desenfreadas. Ela não é tão colorida como as propagandas descrevem. É uma busca por si mesmo, o ser em sua essência – e que não tem nada de natural. É tentar isolar por algum tempo todas as formas de alienação que somente fazem nos afastarmos de nós mesmos. Este “Eu”, que está escondido por “camadas” de alienação, muitas vezes não é assim tão belo. Nem tão forte mas também não tão fraco. Ele é meio incerto e imperfeito. Mas é real. E pode ser muitas coisas desde que se esteja disposto a lutar todos os dias contra tudo o que o impede de simplesmente existir.

segunda-feira, 23 de maio de 2011

Desapego

Somos todos dependentes. E é assim mesmo que deve ser. É duro constatar isso. Vejo isso em mim. Percebo isso em todos, alguns mais, outros menos. E naqueles que eu poderia dizer que não se apegam a nada, vejo somente uma existência beirando ao vazio. A onipotência e o egoísmo parecem sempre levar a um estado de inexistência, falta de sentido.
Nos apegamos à coisas, lugares e principalmente, pessoas. E mais. Almas, representações, idéias e ideologias, religiões, filosofias mais variadas possíveis. Interações e momentos. Parecemos o tempo todo procurar onde nos agarrar. É como se estivéssemos em um disco enorme girando sem parar, soltos, procurando algo que dê um mínimo de estabilidade. 
A verdade que por si só não somos nada. Nossa existência é muito dura. Por mais que lutamos o tempo todo para garantir a sobrevivência material e conseguimos isso muitas vezes sozinhos, sempre precisamos ter um alguém a quem se referir, a quem contar um pedaço do nosso dia, para reclamar de algo ou para apenas "jogar" papo furado.
Por mais que me esforce para separar necessidade de desejo, de compreender que as vezes me mantenho em um relacionamento apenas por necessidade, por não querer estar só, por ter um terrível medo da solidão,  e que o desejo é muito mais que isso, que é a ele quem devo seguir, tudo se embaralha.
E somos assim. Não sabemos se simplesmente queremos algo ou no fundo necessitamos disso. É a mesma coisa. Nosso corpo (e alma) muitas vezes clama por coisas que não sabemos explicar se é desejo, necessidade, fuga ou simples prazer momentâneo. 
Sempre incomodei-me com meu apego a certas coisas e principalmente, idéias e pessoas. Sei que eu precisaria praticar um certo "desapego". Mas meu ser se recusa a apreender isso. Prefiro sofrer todas as conseqüências de assumir meus desejos, ir atrás do que quero, envolver-me completamente, mesmo sabendo que talvez irei literalmente "me ferrar", do que viver no vazio de um mundo "sem amarras", sem desilusões. 
Sinto que preciso passar por isso. Preciso viver, consumir, curtir cada pedaço daquilo que me envolvo. Entrego-me de corpo e alma. Iludo-me, caio, estouro-me. E gosto de levantar. Gosto de começar tudo de novo. Gosto de não ter me arrependido de ter feito. No pensamento tudo é mais fácil, tudo pode, inclusive não se decepcionar. Mas gosto de me decepcionar com as pessoas, de ver que elas são reais, tão imperfeitas como eu. Que são solitárias, carentes e muitas vezes tão idiotas como sou também.
Isso é Ser Humano. Um pouco masoquista? Sim, e sádico também. Somos todos um pouco de tudo. E cada um se apega ao que pode ter.

quinta-feira, 19 de maio de 2011

100 posts

Percebi agora que passei dos 100 posts no blog. Tudo começou em 21 de julho de 2005. Naquela época não sabia direito o que seria este blog. Escreveria contos? Poesias? Relatos auto-biográficos? Acabou sendo um pouco de tudo.
De início eu era o Psicoalcoolista - personagem que criei para dar conta de fundir realidade com ficção e, confesso agora, também uma maneira de não se expor tanto. É que também nunca gostei de blogs muito confessionais. Não interessa saber que o sujeito escovou os dentes às duas da tarde naquele fatídico dia. Tem que haver um algo mais.
É esse algo mais que persigo desde o início, esse caminho que vem sendo construído e que um dia eu gostaria que se chamasse literatura. Não é o simples relato da vida cotidiana, é uma construção, uma interpretação, uma tentativa de conseguir transmitir os afetos que nos transbordam no dia-a-dia. Preferi chamar de impressões -a tag mais utilizada nos posts. Chamei de memória, angústia e solidão. Marcas do subjetivo.
Por vez ou outra me arrisquei em contos e crônicas. Aliás, comecei com uma crônica que mais se parece com um conto de tão surreal que era. Na escrita um esforço para ser direta e subjetiva ao mesmo tempo - técnica que busco incansavelmente inspirado na associação livre freudiana. Era terapia também - e continua sendo.
Há a relação com a música também. Indispensável para compreender os textos. Em cada post uma inspiração musical, uma banda ou um álbum, ou apenas uma canção - que para eu muitas vezes exprimia mais  que o texto o que estava sentindo, mas que no geral servia para compor um recorte, um quadro da existência.
Nesses 5 anos muitas coisas aconteceram. Psicoalcoolista se tornou finalmente Luizfst. Era "um estudante de psicologia estagnado em sua estrutura obsessiva, que observava passivelmente a rica paisagem pós-moderna, tentando elaborar algo desta existência" - a descrição era mais ou menos essa. Hoje é Luizfst, psicólogo, professor universitário, futuramente noivo. Muita coisa mudou. Mas os textos conservam ainda sua essência: a de serem tentativas de elaboração da realidade, seja esta objetiva ou subjetiva, seja a da dor e sofrimento ou da alegria e contemplação. 
Parabéns "Contos Neuróticos Cotidianos", por ter sido meu fiel companheiro de tantas madrugadas e tardes insossas  e que agora, mesmo que sem tempo para se dedicar mais, continua a ser essa "via de escape" de um Real absurdo".

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Saudade


"And the same black line that was drawn on you
Was drawn on me
And now it's drawn me in
6th Avenue heartache"



Como pode minha saudade crescer quando te vejo?
E se tornar insuportável quando vou embora.
Como pode eu desabar quando mais queria te fortalecer?
Os olhos lacrimejarem, o peito estourar, a face se contorcer?

Foi uma semana longa, uma espera incontrolável
Uma viagem tranqüila. Um fim de semana doce como todos encontros com você.
Mas a partida, essa foi dura, eu tentei não parecer.

Dois dias foram pouco. Minha pele pediu mais.
Meu juízo desapareceu diante de sua beleza.
Contemplar sua ternura, compartilhar sua semana.
Como eu senti falta disto.

Senti falta do seu sorriso, do seu olhar de amor.
Do seu cuidado comigo, da sua alegria espontânea.
Senti falta do dia-a-dia mais comum possível.

Eu sei, é só uma fase, é uma transição para nossa vida a dois.
Eu também não esperava ser assim. Com isso só confirmei o que sabia:
Que te quero todo dia, que já não sou mais eu, somos nós.
E que metade de mim ficou lá e a vida é muito dura sem você.

É só saudade, eu sei. É muito mais.
Não sei explicar, não quero.
Vou tocando, te esperando.
Só assim, meio sem saber como, tudo passa.
E a saudade permanece...

Trilha Sonora: The Wallflowers "6th Avenue Heartache", do Album "Bring Down the Horses (1996)"