quinta-feira, 29 de dezembro de 2016

2016: o ano que não quer acabar

Um ano que aconteceu de tudo. Estamos todos cansados, com a impressão de ter vivido tantas coisas em tão pouco tempo. O ano que não quer acabar porque parece haver a sensação que até o seu fim muitas surpresas ainda virão. 

De alguma forma senti que 2016 foi um ano histórico muito importante, seja para o bem ou para o mal. Alguns fatos e acontecimentos ocorridos irão repercutir muito ainda em um futuro próximo. Foi o ano que metade dos brasileiros descobriram a política, e acreditaram tê-la exercida plenamente, enquanto a outra metade, politizada há mais tempo, sentiu justamente o contrário: a demonstração de que nossa democracia é frágil e precária, ao ponto de ter permitido que os velhos barões voltassem ao poder de forma legal, mas não legítima. 

Foi um ano de perdas duríssimas na música. O mago Bowie, Prince, Cohen, George Michael, Sharon Jones, e Keith Emerson e Greg Lake do Emerson, Lake & Palmer. O pior é a constatação que a geração atual (e da última década) não contará com praticamente nenhum artista da envergadura dos que foram citados. 

Pessoalmente foi um ano cansativo e atribulado, mas pleno. Foi o ano que eu descobri o real sentido da palavra "pai". Aprendi mais de Psicologia Infantil do que em toda graduação e quatro anos atuando na Infância do Tribunal de Justiça.

Percebi que cuidar é muito mais do que acompanhar e tal vivência fez-me perceber o quanto é belo o desenvolvimento da criança, assim como a importância do papel que exerço ao estar tão próximo dela nesses momentos tão importantes. Sentir que a sua presença é fundamental, e que ela precisa tanto do pai nesse momento fez-me reestruturar toda minha vida e rotina em torno dela. E que ser pai não é questão de dom ou vocação. É, acima de tudo, entrega e renuncia ao desejo individual. 

No trabalho vi o número de processos aumentarem e ao mesmo tempo um reconhecimento maior de minha função no sistema jurídico, aumentando a responsabilidade. E foi o ano em que coordenei sozinho e coloquei em prática um projeto que vinha pesquisando e avaliando há alguns anos: um protocolo de atendimento interinstitucional para crianças e adolescentes vítimas de violência sexual. 

Foi um ano que esforcei-me em tocar todas essas atividades ao mesmo tempo. E que em alguns momentos levaram-me a pensar que não conseguiria dar conta de tudo - pelo menos com a qualidade que sempre exigi de mim mesmo - mas que novamente surpreendi-me por ter conseguido. 

Foi o primeiro ano que desejei profundamente: férias.

Trilha Sonora: "A Moon Shaped Pool" - Radiohead (melhor disco do ano!)


domingo, 23 de outubro de 2016

Vojão

Era uma manhã cinzenta. Aquela cena nunca mais sairia de minha mente. Meu avô descendo do carro. Amarelo. Seu semblante não era de dor. Resignação. Eu nunca o havia visto daquela maneira. Olhar perdido. O soldado finalmente havia batido em retirada.

Os dias iluminados de céu azul da Ucrânia haviam ficado para trás. E minha breve adolescência também. Good bye blue sky. "Os homens bons não morrem. Sobem aos céus para tornarem-se anjos". E o meu anjo se foi naquela tarde de 17 de setembro de 1998.

Ele era o modelo de homem. Meu referencial de ser humano. Era extremamente bondoso, mas ao mesmo tempo justo. Honesto e inteligente. Um tanto quanto ranzinza, e tinha um senso de humor implacável. Abriu-me as portas do mundo ao ensinar-me a ler. Valorizava o saber acima de tudo e sabia o quanto isso transformaria completamente minha vida. Foi meio pai, meio avô. Avôhai. Vojão.

O princípio da juventude havia sido brilhante e delicioso. O mundo se abria com toda sua força e esplendor. A vontade era de apenas viver intensamente, voar, navegar livre em um mar de liberdade e contemplação. Pela primeira vez sentia que podia abrir-me, sair do enclausuramento e encarar a vida de frente. E como em um golpe, ela veio logo com tudo. Seca, dura e incompreensível. Bateu forte e foi embora, levando junto os últimos sopros de inocência e serenidade. 

Os anos que se seguiram foram de escuridão. Incompreensão, revolta e dor. Mergulhado em tristeza, eu via o mundo a minha volta desaparecer e esfalecer-se. A louca felicidade juvenil deu lugar à angustia e encerramento em si mesmo. 

Eu não tinha mais referências. Procurava cegamente uma saída para o quê eu mesmo não conhecia. Apegava-me a quem meramente estendia uma mão, buscando não afundar. Não sei bem como eu sai dessa. Foi a fase mais obscura de minha vida. Foram anos tentando elaborar essa perda que até agora repercute e coloca-me a refletir sobre uma parte do passado que ainda não superei completamente. 

Passaram-se dezessete anos, e essa é a primeira vez que consigo escrever sobre o Seu João, ou melhor, sobre a sua perda. A dor é ainda grande, assim como são as doces lembranças dos anos incríveis que passei junto desse ser iluminado que participou ativamente de minha infância e adolescência, contribuindo para minha formação enquanto homem, ser humano, e agora, pai. Saudades!

Para meu anjo Vojão. Fly on little wing!

Trilha Sonora: "Little Wing" - Jimi Hendrix; "Sailing" - Rod Stewart; "Goodbye Blue Sky" e "Mother" - Pink Floyd; "My Friend of Misery" - Metallica.


Vojão

Era uma manhã cinzenta. Aquela cena nunca mais sairia de minha mente. Meu avô descendo do carro. Amarelo. Seu semblante não era de dor. Resignação. Eu nunca o havia visto daquela maneira. Olhar perdido. O soldado finalmente havia batido em retirada.

Os dias iluminados de céu azul da Ucrânia haviam ficado para trás. E minha breve adolescência também. Good bye blue sky. "Os homens bons não morrem. Sobem aos céus para tornarem-se anjos". E o meu anjo se foi naquela tarde de 17 de setembro de 1999.

Ele era o modelo de homem. Meu referencial de ser humano. Era extremamente bondoso, mas ao mesmo tempo justo. Honesto e inteligente. Um tanto quanto ranzinza, e tinha um senso de humor implacável. Abriu-me as portas do mundo ao ensinar-me a ler. Valorizava o saber acima de tudo e sabia o quanto isso transformaria completamente minha vida. Foi meio pai, meio avô. Avôhai. Vojão.

O princípio da juventude havia sido brilhante e delicioso. O mundo se abria com toda sua força e esplendor. A vontade era de apenas viver intensamente, voar, navegar livre em um mar de liberdade e contemplação. Pela primeira vez sentia que podia abrir-me, sair do enclausuramento e encarar a vida de frente. E como em um golpe, ela veio logo com tudo. Seca, dura e incompreensível. Bateu forte e foi embora, levando junto os últimos sopros de inocência e serenidade. 

Os anos que se seguiram foram de escuridão. Incompreensão, revolta e dor. Mergulhado em tristeza, eu via o mundo a minha volta desaparecer e esfalecer-se. A louca felicidade juvenil deu lugar à angustia e encerramento em si mesmo. 

Eu não tinha mais referências. Procurava cegamente uma saída para o quê eu mesmo não conhecia. Apegava-me a quem meramente estendia uma mão, buscando não afundar. Não sei bem como eu sai dessa. Foi a fase mais obscura de minha vida. Foram anos tentando elaborar essa perda que até agora repercute e coloca-me a refletir sobre uma parte do passado que ainda não superei completamente. 

Passaram-se dezessete anos, e essa é a primeira vez que consigo escrever sobre o Seu João, ou melhor, sobre a sua perda. A dor é ainda grande, assim como são as doces lembranças dos anos incríveis que passei junto desse ser iluminado que participou ativamente de minha infância e adolescência, contribuindo para minha formação enquanto homem, ser humano, e agora, pai. Saudades!

Para meu anjo Vojão. Fly on little wing!

Trilha Sonora: "Little Wing" - Jimi Hendrix; "Sailing" - Rod Stewart; "Goodbye Blue Sky" e "Mother" - Pink Floyd; "My Friend of Misery" - Metallica.


quarta-feira, 3 de agosto de 2016

Gabriela, 1º ano de vida!

 Um dia eu desejei viver uma vida plena. Isso na época significava ter meus desejos mais urgentes realizados. O tempo passou, e com isso eu fui percebendo que essa urgência era coisa da idade. A vida foi simplesmente acontecendo diante de mim. Para quem vivia um sonho dentro de outro sonho, fui surpreendido pelo simples acontecer da vida, e diante de uma grande oportunidade, apenas decidi viver aquele momento.

Foi quando me permiti encontrar-me com um anjo, que com toda sua simplicidade, alegria e vontade de viver, apresentou-me o mundo novamente. Agora muito mais colorido, vívido, e simples. Ela não exigiu nada de mim, apenas que fosse seu companheiro constante em uma jornada a dois.

Passaram-se alguns anos de uma convivência mágica e esse mesmo anjo resolveu presentear-me com seu maior tesouro. Uma filha. Um fruto de um amor vivido tão intensamente nos últimos anos.


Seu nascimento foi o momento mais intenso e importante de minha vida. Eu fui o primeiro a vê-la, com toda força e beleza que um nascimento provoca. Acabei-me em lágrimas, emoções, sonhos e tudo mais que aqueles segundos de intensa vivência proporcionaram-me. Era a minha filha, minha linda Gabriela nascendo diante de meus olhos. Meu mundo girou, mudou, transformou-se.



Então que me vi pai pela primeira vez. Eu quis tanto fazer parte daquilo, e participei de cada momento desde então. Faço questão de cuidá-la todas manhãs. É o momento só nosso!



E os dias foram passando depressa desde que ela chegou. E todo dia noto algo diferente nela. Como ela cresce, desenvolve-se, apreende tantas coisas novas. Seu sorriso enche-me de orgulho e felicidade. Cada passo, cada movimento novo, aprendizagem. Cada interação e pequena demonstração de afeto. Tudo enche nossos corações de alegria!




Agora nossa Gabi completou um ano. E as lembranças dos momentos de espera por sua chegada, de como nos preparamos para aquilo, dos minutos antes do parto no hospital, quando eu só pensava em apoiar e proteger a Hilda, surgem em minha mente em flashes, e as emoções voltam com toda a  força.


Nossas famílias se encheram de vida e luz. Todos vibraram tanto com sua chegada, e encantaram-se com sua graça e alegria em viver. 


Foi um ano de intensas mudanças, de readaptação e de reestruturar toda nossa vida. E foi um período de muita aprendizagem, de entrega e muita paciência. Você, nosso anjinho, exige muito de nós, mas o prazer e o amor que nos proporciona é maior que tudo, e cada dia sentimo-nos mais apaixonados e felizes por você estar aqui com nós. Parabéns pequena Gabiela, razão maior de nossas vidas!












"When I need to get home, you're my guiding light, you're my guiding light" - Foy Vance, "Guiding Light"


domingo, 15 de maio de 2016

Just another day in paradise...

Eu queria, ao menos, só mais uma vez, voltar naquela época. Chegar na chácara, com todos os cachorros nos recebendo, e a Belina entrando por aquela estrada estreita, quase encalhando, e o Vô e a Vó nos esperando, com aqueles olhos brilhando…

A grama cortada, o fogão aceso, o pão descansando para entrar ao forno à meia-noite…Era o famoso “Pão da Meia-noite”.

No outro dia, após o café, era aquela farra. Nós procurando botas no galpão, cachorrada esperta para sair. Vô ligava a Tobata, pegava todo mundo, e bora para a roça. Aquela estradinha quase fechada, cheia de sonhos e imagens.

Depois de pegar pepinos, mandiocas, chuchus, todos iam para o rio. Lá os cachorros faziam a festa, e se estivesse calor entravamos juntos na água fria da serra. A mãe ficava brava. O Kiko e o Urco voltavam sujos, molhados, cheios de terra.

Na volta, o fogo da churrasqueira já estava aceso. Era hora de “queimar osso”, como Vô João dizia. Enquanto nós brincávamos, a carne ia assando. Almoçávamos, brincávamos mais um pouco, e era hora de ir embora. A Vó ficava muito triste. Ela ficava parada ao lado da casa e esperava o carro do pai passar e buzinar. Era a despedida. Talvez o pai não saiba até hoje o quanto era importante para a Vó ouvir aquela buzina!

Eu sei, por que eu fiquei algumas vezes de férias com a Vó e ouvia a buzinada melancólica da Belina 87. Era um som que surgia alto e sumia no mato, enquanto o silêncio ia estabelecendo-se no local. E então a Vó ligava sua vitrola, e Cascatinha e Inhana tocava, com aquela doce melancolia.

No carro do pai, enquanto voltávamos, tocava Phill Collins, naquele velho toca-fitas Bosch. E quando o pai acabava de virar a curva, buzinando, era o sinal de que o fim de semana havia acabado. Era melancólico. E na chácara, a Vó somente esperava, o próximo fim de semana chegar...

Do you remember?


segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

A vida não começa segunda-feira

Mais um dia vazio. Perdido entre a inércia e os devaneios. Essa sensação esmagadora de que não é possível produzir nada - e pior, que sem produzir, sou nada. 

Só rezar para que o dia logo acabe. Isso não é vida. Saber disso, reproduzir isso constantemente - é uma tortura. Não buscar saída por não se querer sair, apenas ficar no lodo da perdição e deixar-se afundar. Mas não afunda. Pelo menos o suficiente para interromper toda essa merda. 

Eu sei, foi apenas mais um dia ruim, como todas as segundas-feiras que se optou por não viver. A vida.