sábado, 30 de março de 2013

Páscoa

Trilha Sonora para este post:

Esta noite acordei de um sonho em que meu avô havia "retornado" à vida e ele questionava quando seria o meu casamento. Eu respondi consternado: "foi em dezembro, vô". A música do Led Zeppelin não parava de martelar em minha cabeça: "babe, babe, I'm gonna leave you". Pensei em como seria se meu avô (e agora também minha avó) estivessem ainda vivos hoje, e o quanto eu sinto falta deles nessas datas importantes.

Isso se deu em meio à Páscoa, feriado talvez o mais importante em uma família ucraniana católica. Lembrei de quantas vezes repetimos os mesmos rituais de Páscoa a cada ano, e o quanto isso era fundamental para meus avós e pais, e de como isso traz à minha memória doces lembranças quando eu era criança e meus avós ainda estavam vivos.

A Sexta-feira Santa era o dia "mais chato", pois todos faziam jejum e nós não podíamos fazer nada, era preciso guarda a sexta, fazer silêncio, e nós crianças não podíamos brincar. O pai e o vô ficavam o dia todo vendo filmes bíblicos, sempre os mesmos! E nós arranjávamos uma maneira de brincar sem fazer barulho e perturbá-los.

Sábado era bem mais legal. Os pães e carnes assando para a benção dos alimentos à tarde. O cheiro do pão da vó assando era inconfundível, e nós já ficávamos morrendo de vontade de experimentar! A noite vinha a missa mais longa do ano, e nós dávamos um jeito de "escapar" da igreja para não ficar o tempo todo lá dentro. Na volta era só alegria, a Ceia e depois ganhar os ovos de chocolate. Impossível esquecer as vezes em que a vó escondia os ovos e nós tinhamos que achá-los!

Domingo era toda a família reunida na casa do vô e da vó: churrasco, adultos bebendo e a criançada solta pela casa. De vez em quando apareciam uns familiares não sei da onde. Era a maior bagunça. E como faz falta lembrar de como era tudo isso.

Essa será a primeira páscoa sem a vó, que veio a falecer em setembro passado, e tudo já parece estar sendo diferente. Fica uma sensação de que todas essas tradições só faziam sentido com eles por perto, mas sabemos que não deve ser assim. Por isso resolvi fazer a minha própria Paska ucraniana, pois agora tenho também minha família (que por enquanto é só eu e a Hildinha!), e quero muito manter estas tradições que dizem tanto sobre  minhas origens e o que representa minha família: uma união, uma linda união que vai se mantendo, mesmo com a geração mais velha não mais existindo. E acima de tudo quero que meus filhos tenham as mesmas doces lembranças que tenho de minha infância durante a Páscoa!

Trilha Sonora: "Your time is gonna come" - Led Zeppelin
Obs.: "Babe I'm gonna leave you" ficaria muito pesado para este post!

terça-feira, 26 de março de 2013

Consciência/Ausência



Trilha Sonora para este post:

Tudo tão quieto. Tem dias que minha mente voa tão longe que chego a ouvir o silêncio das alturas.   

Como se flutuasse na imensidão azul e apenas o lento passar das nuvens dispersasse minha atenção.

Perco-me nesta ausência de sentidos e quando me dou conta estou ainda aqui, na terra, realidade mundana. Sei que é uma maneira de ausentar-me e fugir de minhas pequenas obrigações. É um “deixar-de-ser-a-si-mesmo” momentâneo, espaço temporal necessário para recomeçar tudo de novo.

É sempre assim, e tenho plena certeza disso. Já conheço o roteiro, as fugas rápidas da realidade e a entrega em livres pensamentos. Memórias antigas, sensações atuais e desejos futuros misturam-se constantemente. Gostaria de poder relatá-los, mas logo os perco na troca por tantos outros.

E assim a minha segunda-feira passa, mesmo com toda procrastinação e o lento arrasto das horas. 

Trilha Sonora: Nada Surf "Neither Heaven Nor Space".

quinta-feira, 21 de março de 2013

[Conto] A Woman Left Lonely Again

Trilha Sonora para este post:
Ela partiu sozinha novamente. Acordou de sonhos horríveis e decidiu apenas viajar. A realidade estava a torturando demais. Em meio a um delírio teve a ideia de ir a Foz. Sempre sonhara conhecer as Cataratas. Desde que o pai a deixara na Rodoviária de Paranaguá, aos sete.

Foram tantas coisas nestes anos. Foi a Mãe adoecendo e caindo aos seus braços. Pedro que nunca mais viu.  Como será que ele está? Grande? Bonito?

O que é minha vida? No que se transformou?

Lembrou de quando era uma garotinha e a última imagem do Pai, fumando um cigarro enquanto prendia o gado. Eram tão felizes. Sua Mãe não. Ao chegar na cidade veio a perdição. Promessas e encantos, jovens e velhos. Tudo era novidade. A Mãe cada vez mais infeliz. O Pai e o Bar.

Perambulando pelas ruas conheceu tudo. O Inferno e o Céu estavam ali, tão próximos e fugazes. João foi o primeiro. Depois veio Francisco, o Velho. E Papai, onde estava?

Foi a primeira vez que partiu, e o seu coração junto. Queria a vida, os infortúnios e a felicidade. Podia ser a dor, mas era a liberdade, acima de tudo, o que buscava. 

Andou e andou por ai. Rodou os tantos cantos deste país. Conheceu Maria e também a Solidão. Parou no Hospício, por três anos, e ali desconstruiu tudo. Achou seu Pai, seus Fantasmas e o Diabo. Saiu. Viajou, novamente, demais.

E agora, indo novamente, onde dará?

Trilha Sonora: "Jukebox", álbum - Cat Power. "Woman left lonely" - Janis Joplin.

quinta-feira, 7 de março de 2013

Desconectado

Trilha Sonora para este post:
Olhar para si mesmo e achar que algo está errado. 
Sempre falta. Ou transborda. 
Encontrar o tal “equilíbrio”, a homeostase.

Preso entre o desejo e a censura. 
Quero! Posso?
Onde e como?

Sair da zona de conforto e enfrentar a imprevisibilidade do devir. 
Isso pode significar perder o que já se conquistou.
Ou não.

O que mata mesmo é o imaginar. 
É bom sonhar, projetar, deixar-se entregue aos devaneios.
Mas e a realidade? Enquanto eu sonho a vida acontece.
E a perco, o tempo todo.

Onde eu estava quando aqui tudo acontecia?

Sobra-me o passado a analisar. O futuro a criar.
E o presente? Por que nunca o alcanço?

Quem é esse Outro que tanto me demanda?
Por que o encontro com o outro me choca? 
Qual o seu desejo?
Não me vejo e tento reconhecer-me.

Desconectado.

Queria apenas viver como tudo se é.

Trilha Sonora: “Faust Arp”, “Reckoner” e “Nice Dream” – Radiohead; “Life on Rain” – Remy Zero.

segunda-feira, 4 de março de 2013

[Série Psicanálise] Alma Melancólica


"The Murderess" (1906) - Edvard Munch

Trilha Sonora para este post: Can't Stop by Elbow on Grooveshark



Tem dias por mais que estejamos bem, dispostos e até alegres, somos tomados de repente por uma sombra. Podem ser sentimentos nostálgicos, certa introspecção ou apenas uma mudança repentina de humor e sensações. Às vezes é uma música que ouvimos que nos remete a um passado que já algum tempo não tomamos contato, e que talvez tenhamos tentado esquecer ou afastá-lo, mas, que mesmo assim, ele insiste em retornar. Ou um flash contendo imagens e sensações que surgem do nada em nossa consciência, deixando-nos assim, meio parados, com o pensamento distante.

Já cheguei a conclusão que existem pessoas, que como eu, tem uma “alma melancólica”, e isso muitas vezes faz muito sentido. Quando penso no mundo de hoje, com seu imediatismo, superficialidade e excesso de informação, vejo-me deslocado, como se vivesse em outro tempo. Tento adaptar-me ao tal ritmo e as diferentes configurações atuais, mas parece que sempre chega uma hora em que falho, penso comigo mesmo: “eu não sou assim, não consigo ser desse jeito”, e então sinto culpa e logo em seguida uma certa tristeza por “ter falhado”.

Quando reflito (a reflexão, outra ação que os habitantes na vida atual tentam desprezar ou ignorar) sobre o porquê desse sentimento, percebo que não há nada de errado em sentir-me assim, que a “tristeza” (seria a angústia o termo mais correto) é condicionante humana e que os tempos modernos tendem  a querer eliminá-la de qualquer forma, e sabemos, ela irá retornar, de alguna forma, talvez como sintoma ( como depressão, ansiedade, fobias e pânico, p. ex.).

Então penso que minha angústia é “sadia”, no sentido de que não quero abrir mão de um sentimento que é o que me faz humano, na medida em que ainda tento sentir e viver este mundo da forma como ele é: imperfeito e incerto, e que uma hora ou outra irei falhar, ou não conseguirei “acompanhar” o ritmo da “carruagem”, e então “cairei”, e por que não, levantarei meio “ralado” e começarei tudo de novo! É assim que as coisas são e livrar-me desta tristeza fará com que eu deixe de realmente vivenciar a complexidade que é esta experiência de existir.