quarta-feira, 21 de setembro de 2005

Life in a Glass House

Ele não conseguia entender porque era assim. Acordou atrasado naquele dia. Seu café da manhã foi um cigarro. Ficou esperando o ônibus enquanto olhava para uma velha sebosa que parecia procurar seu cartão-transporte em alguma parte de uma bolsa velha de couro. Terminou seu cigarro, o ônibus chegou. Lotado, amarrotado, cheiro de trabalhador. Olhou para o lado e viu uma ninfeta toda arisca. Não para ele. Pelo menos tinha o quê olhar no meio de uma multidão de trabalhadores, velhas rabugentas e gordas crentes. Era o mínimo de contemplação num ônibus lotado às 6:32 da manhã. Chegou ao centro da cidade. Multidões de zumbis seguindo seus caminhos. Vendedores oferecendo cigarros, pão de queijo; cd, cd, cd. Ficou puto, não queria trabalhar. Olhar aquelas mesmas caras de sempre, mesmas tarefas de sempre. Lembrou de Maria, do verão, do cheiro de seus cabelos, do sorriso maroto, das safadezas. Flashes de memória que sempre insistem em aparecer em momentos nada agradáveis. Fumaça dos carros, traveco na esquina, mendigos deitados no chão frio da calçada, molequinhos cheirando cola. Ganha trezentos reais, trabalha quarenta horas semanais, V.R de cincão. Gosta de pescar nos fins de semana. Toma uma garrafa de pinga, aquela de um real e garrafa de plástico, fuma uma carteira de cigarros italianos e vai embora sem nenhum peixe. Na volta passa no boteco, joga truco, arruma uma briga e vai louco pra casa, balbuciando palavras soltas. Ressaca, dor de cabeça, dia chuvoso e um frio que congela os ossos. Acha tudo isso uma porra de vida. Mas não sabe porque tudo é assim.
Trilha Sonora: Radiohead "Life in a Glass House"

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